A AGRESSIVIDADE DAS MINORIAS

 



Ontem uma pessoa me perguntou por qual razão eu sempre ficava tão “agressivo” quando entrava em uma discussão sobre minorias. Bom, decidi escrever esse texto respondendo não apenas a esta pessoa, mas a todos que compartilham o mesmo pensamento: por que as minorias parecem ser tão radicais e briguentas?

Porém, antes da resposta, gostaria de chamar atenção para a palavra “agressivo”. Agressividade, segundo o Dicionário tem muito mais a ver com o ato de atacar e provocar do que com a conduta reativa. 

Será então essa a palavra certa?

Ademais é muito cruel o uso de termos como esse, sempre focados em desqualificar o discurso minoritário, enquadrando o interlocutor como “louco, desequilibrado ou agressivo”, mas sem jamais apresentar contra-argumento.

O privilégio coloca pessoas brancas-heterossexuais-cisgênero em escalão de seres portadores de opiniões indiscutíveis e cristalinas e, quando rebatidas, é porque você não entende... você é agressivo... você precisa de tratamento. 

O fato é que essas pessoas – e, óbvio, estou generalizando – nunca souberam conviver conosco – elas apenas nos toleram – e, para mantermos essa equação de sermos “permitidos” na casa, precisamos de contínuo entender o tempo de cada um e ter paciência com a desconstrução (?) lentíssima de preconceitos. E, sobretudo, somos obrigados a engolir, como a sapos, os comentários mais dolorosos. Numa festa de família ou num domingo qualquer, por exemplo, temos de deixar de ser quem somos, para que eles consigam ser quem são, com todos os preconceitos.

E é muito importante entender que só quem vive, sabe. Não importa o mestrado, ou doutorado... Aliás quantos livros da sua área foram escritos por negros, ou trans, ou gays? Já perdi, por exemplo, as contas de quantas vezes ouvi comentários sobre como eu tenho “psicologicamente/terapeuticamente/ energeticamente” o lado feminino aflorado. O nome disso não é machismo? 

Não tenho problema algum em saber-me possuidor de um lado feminino tão vigoroso, mas me faz um ruído saber que ser feminino é ser “frágil”, “delicado”, “chorão”, “maternal”. Se eu fosse mais homem eu seria mais forte, mais líder, mais assertivo, mais frio?

Agora voltando à questão da minha agressividade, a resposta é muito simples. Eu sou “agressivo” quando o assunto é minorias, porque dói! 

Sou “agressivo” porque a minha primeira memória da infância é de uma menina jogando um tijolo na minha cabeça. Eu sou “agressivo” pois aos 7 anos, em um aniversário, alguns meninos me pegaram e me jogaram dentro da piscina, entre sons de “viadinho”. Eu sou “agressivo” quando debato esse assunto simplesmente porque “dói” demais. 

Dói ter medo de ser demitido do trabalho por ter a voz anasalada. Dói não poder demonstrar o amor em público. Dói ser parado numa blitz e torcer para que o policial suponha que seu namorado seja seu irmão. Dói ter um amigo hétero e todo mundo viver perguntando se ele é viado simplesmente por ser seu amigo... afinal não importa quantos livros foram lidos, o quanto goste de cinema, o quanto tenha um papo legal... para essas sociedade o gay só tem a genitália a oferecer.

Dói demais ouvir pessoas heterossexuais expressando opiniões dolorosas sobre coisas nunca vividas, nunca lidas, nunca imaginadas. Portanto, toda vez que formos “agressivos” em nossas respostas, perguntem-se se não há uma agressividade escondida nas suas falas... mesmo tendo sido dadas de maneira tão gentil.

E antes de me dizerem que as pessoas não tem culpa, eu digo: lamento, mas se você não percebe seus privilégios, se você não luta efetivamente para mudar esse massacre institucional de minorias, a culpa é sua sim!

Grande abraço e passar bem.

 

Saulo Sisnando

06 de janeiro de 2021

17h39min

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