Lagoa Seca

De todas as minhas lembranças, esta a mais bela. Uma velha ouvindo rádio, uma solidão, um penico... O último quarto de uma casa amarela. O cheiro da grama molhada de manhã, Os gafanhotos insensatos, voando e fazendo barulho; O jardim cheio de rosas. Os pés de romã. O vira-lata mancando, com nome de vitória O pé de seriguelas de doces frutos a cair no chão; A lenda do cachorro fantasma na noite de lua cheia. Os bancos com pés em formas de cavalos, Onde conversamos sobre sonhos jamais realizados; Os vaga-lumes piscando em breves estalos. Nenhum céu, de nenhum lugar, tem mais estrela, Que o céu da Lagoa Seca, do sertão do Ceará, A mais bela e irretocável celeste aquarela Que Deus foi capaz de pintar. Mas hoje tudo é cimento, cinza, altos prédios. Da casa amarela, nem o penico resta no lugar O perto, ficou longe. Abraços quentes... agora, frios Mas a memória continua e invade... violenta... como o mar....