SOBRE AMAR EM SEGREDO



Para alguém sem nome.

Então você decidiu que nunca mais se apaixonaria, que guardou mesmo a viola no saco e percebeu que esse lance de amar não era para você... Pois o destino parece realmente te querer sozinho.
Se levarmos em consideração a matemática – que é uma ciência e-xa-ta –, se apaixonar tem tudo para dar errado!
Ora, com esses bilhões de pessoas, que transitam pelo planeta Terra, encontrar a sua alma gêmea... Aquela que te completa... A metade da laranja... OYin do seu Yang... Parece mesmo ser uma tarefa bem impossível.
Porém...
Também não seria improvável que, com tantas almas andando por aí, você nunca mais encontrasse alguém com um sorriso tão lindo?
É... Contrariando a matemática, esse momento chega! E num belo dia, numa quinta-feira qualquer, no início da tarde, quando você mudou os planos, faltou ao inglês e decidiu ir (sei lá) para a academia, você encontrou alguém que é exatamente como você sempre sonhou.
Não que seja lindo... Embora seja! Mas é uma beleza não unanime; é uma lindeza dentro da imperfeição. E você percebe que, além do sorriso vasto de dentes miúdos, ele ainda se mexe de um jeito estranho... Uma forma que te invade o coração e te domina por dentro. Um andar que parece ter mais do que passos, pois vem recheado de cheiros e de gostos.
Eu realmente acho que eu me apaixono pela forma como as pessoas andam... Pela maneira como elas se movem.
E, desse dia em diante, sua rotina mudou. Você aposentou o inglês... Pois afinal, para que outra língua se você não tem para quem dizer I Love You? E suas tardes viraram uma sucessão de pequenas tentativas de encontro.
Quando você aperta o passo para pegarem o mesmo elevador e, lá dentro, você – tímido em grau mil – congela e suas mãos desesperadas apertam o celular , querendo puxar assunto e ao mesmo tempo sonhando com a possibilidade alguém te mandar um whatsapp, só para que você possa ter para onde olhar e o que fazer com as mãos. E quando a porta abre, você, vendo que perdeu a grande chance, solta um alto e desajeitado: “a cidade tá quente, né?” E ele te olha de volta, como se você fosse um louco varrido, e responde: “pois é! Um forno”. E então ele desaparece pelos corredores.
Amar em segredo é mesmo uma delícia. É seguir ele até o carro, para que, no dia seguinte, você escreva um poeminha bem cafona e coloque no parabrisas, com a assinatura: “admirador secreto”. Amar em segredo é querer, no dia dos namorados, mandar anonimamente flores... É querer oferecer carona... É descobrir seus autores preferidos, só para que possam ler os mesmos livros.
Amar em segredo é querer perder uns quilinhos... É rir de piadas sem graça... É cortar o cabelo para parecer mais jovem e descolado. É tentar descobrir significados ocultos nas frases mais simples. Amar em segredo é sonhar que um dia você e ele possam ir juntos a San Francisco e, ao passarem pela Golden Gate, você possa comentar: “sempre quis trazer a pessoa que eu amo aqui”.
Amar em segredo é escrever um texto, só para que – entre tantos amigos – ele curta a publicação. Amar, como estou amando, é desejar da forma mais profunda, que ele receba todo essa paixão (por que é apenas uma paixão) e entenda cada letra... E, ao mesmo tempo, que ele – nalgum milagre inexplicável ou deficiência cognitiva – jamais perceba que tudo foi escrito para ele. Pois o desejo de qualquer escritor é que seu texto chegue ao seu verdadeiro destinatário.
Pois esse é um jeito de dizer, com todas as letras, “eu estou apaixonado por você”... e mesmo assim, estar protegido entre letras Times New Roman e por uma tela de computador.


Saulo Sisnando
Quinta, 11 de junho de 2015.



21h08min

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